terça-feira, 3 de março de 2009

Terra do Incra na Amazônia é colocada à venda ilegalmente na internet


Vendedor mora na Inglaterra e alega ter comprado área de assentado.
Órgão federal diz que esse tipo de negócio é proibido.


Terras de um assentamento de reforma agrária na Amazônia foram postas à venda de forma irregular em anúncios em pelo menos três sites da internet, descobriu a equipe do Fantástico. O homem que se diz proprietário é Ernesto Costa, que mora a mais de 9 mil quilômetros de distância, em Woking, cidade perto de Londres.

 

Segundo os anúncios, “a terra é muito fértil” e o “sítio vai valorizar muito”. O preço exigido pela área de dois quilômetros quadrados é de R$ 300 mil. Por telefone, um membro da equipe de reportagem fez contato com Costa, apresentando-se como possível comprador. “Meu sítio tem localização privilegiada para gado. Do jeito que está lá, dá para montar umas 250 cabeças, sem fazer mais nada”, conta o vendedor.


Segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a venda é ilegal porque a fazenda fica numa área pública. O assentamento localizado no município de Novo Mundo (MT) chama-se Barra Norte, tem 42 km² e foi criado em 2001. Por lei, os assentados só têm o direito de negociar a terra depois de um período de 10 anos. 

Nos anúncios na internet, Costa reconhece que a fazenda é formada por três lotes que ele comprou de assentados do Incra. “O Incra vai lá e dá as terras para eles. A primeira coisa que fazem é trocar. Os caras fazem um rolo danado para aqueles lados”, diz Ernesto Costa, ainda pelo telefone. 

A equipe de reportagem passou uma semana na região e verificou que vários lotes do assentamento estão praticamente abandonados. E todos que moram ali sabem da existência do comércio de terras da reforma agrária. Os compradores não recebem escritura. Por isso, o preço é bem abaixo da média do mercado. 

Gastos

O Fantástico procurou Ernesto Costa, o brasileiro que colocou os anúncios na internet, em sua casa na Inglaterra. Ele trabalha como jardineiro e diz que tem muitos gastos para manter a fazenda. 


“Tudo que eu consegui guardar na vida é aquilo lá. Se eu não vender esse sítio, pegar o dinheiro para fazer algo, vou ficar o resto da vida aqui, mantendo esse sítio”, reclama. 

Costa diz que sabia que os lotes não tinham escritura e que por isso fez um contrato de compra e venda com os assentados. Agora alega estar arrependido. Só não desistiu de vender a fazenda. “Tenho certeza de que vou conseguir vender. Tem um monte de gente que nem eu, querendo melhorar de vida. Assim que a gente vender, vai embora para o Brasil”, diz. 
Procurado pelo Fantástico, o Incra enviou uma nota alertando que a venda dos lotes de reforma agrária é crime e que os contratos de compra e venda não são permitidos.


Fora de programa

O assentado que incorrer nessa irregularidade perde a terra e nunca mais será beneficiado pelo programa nacional de reforma agrária. Já o comprador deve desocupar o lote, uma vez que a terra é pública. 


No assentamento Barra Norte, além da venda de lotes, o que chama a atenção é o tamanho do desmatamento naquele pedaço da Amazônia. 

Um internauta que acessa o 
Globo Amazônia e esteve recentemente em Novo Mundo denunciou ao portal que “apesar da fiscalização, o desmatamento continua. A estratégia usada agora é cortar e transportar madeira à noite”. 
O fato é confirmado por um motorista encontrado pela equipe de reportagem quando transportava madeira tirada irregularmente do assentamento. “A gente trabalha igual a bandido. Esse é que é o problema”, diz.

 

Se você sabe de casos de irregularidade ou crimes ambientais cometidos na Amazônia, denuncie pelo e-mail globoamazonia@globo.com .

 

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