quarta-feira, 8 de abril de 2009

Ainda, De Gaulle e a Guerra da Lagosta


Ainda, De Gaulle e a Guerra da Lagosta

Por Cel Eng R/1 Hiram Reis e Silva, Porto Alegre, RS, 07 de Abril de 2009

“Le Brésil n’est pas um pays sérieux”
- O Brasil não é um país sério (Charles de Gaulle)

- O Contestado Parágrafo

“Frase atribuída ao presidente francês Charles André Joseph Pierre-Marie De Gaulle, por ocasião da crise diplomática entre Brasil e França em 1962. A apreensão de embarcações francesas que pescavam lagostas em águas territoriais brasileiras teria irritado Charles Gaulle levando-o a afirmar que ‘o Brasil não era um país’. Na realidade o autor da frase é o embaixador brasileiro na França, Carlos Alves de Souza Filho. O embaixador depois de discutir com De Gaulle a questão da ‘guerra da lagosta’, relatou ao jornalista Luiz Edgar de Andrade, na época correspondente do ‘Jornal do Brasil’ em Paris o encontro dizendo-lhe que falaram sobre o samba carnavalesco ‘A lagosta é nossa’ e das caricaturas que faziam do general De Gaulle, terminando a conversa com a seguinte frase: ‘Edgar, le Brésil n'est pas un pays sérieux’. O jornalista, por sua vez, encaminhou o despacho para o jornal e a frase acabou sendo outorgada a De Gaulle”.

- Polêmica Frase, Controversa ‘Guerra’

Por diversas vezes a polemica frase, atribuída ao presidente francês Charles André Joseph Pierre-Marie De Gaulle, e a controversa e esquecida história ‘Guerra da Lagosta’, que causou estremecimento nas relações franco-brasileiras, no início da década de sessenta, voltam à baila quando faço menção a elas nos meus textos. Listo, abaixo dois artigos, completos e elucidativos, escritos por Cacau Menezes e Guilherme Poggio que , penso, deverão esclarecer por completo as referidas questões.
- Frases que viraram Mitos - Jornalista Ozias Alves Jr (23/01/2008)
“Na nota intitulada ‘Vergonha’, Cacau Menezes escreveu na sua coluna, no Diário Catarinense, de quarta (23 de janeiro de 2008): ‘Quando o general De Gaulle teria dito que o Brasil não era um país sério, parece que pensou em hoje.’ Não é a verdade. De Gaulle nunca disse: ‘O Brasil não é um país sério’. No entanto, ganhou a fama e essa frase é constantemente repetida. 

Segundo o escritor Fernando Jorge, a frase ‘le Brésil n'est pas un pays sérieux’ - O Brasil não é um país sério - foi dita pelo diplomata brasileiro Carlos Alves de Souza, que registrou em seu livro ‘Um Embaixador em tempos de crise’, publicado em 1979 pela editora Francisco Alves. Nas páginas 316 e 317 do livro, o diplomata conta que, nos anos 1960, teve um encontro em Paris com o general De Gaulle para analisar o problema dos pesqueiros franceses que estavam invadindo águas territoriais brasileiras para pescar lagostas. O episódio ficou conhecido como ‘Guerra da Lagosta’. 

Depois do encontro com De Gaulle, o diplomata Carlos Alves de Souza foi a uma recepção na casa de um deputado onde encontrou-se com um jornalista chamado Luiz Edgar de Andrade, que mais tarde tornou-se editor na TV Globo”. 
O repórter perguntou sobre o encontro com De Gaulle. O diplomata comentou ter sido informado que o incidente, na realidade coisa de pouca importância, acabou transformando-se até mesmo em samba carnavalesco intitulado ‘A Lagosta é nossa.’ Então o diplomata terminou a conversa assim: ‘Luiz Edgar. Le Brésil n´est pas um pays sérieux.’
O repórter mandou um telegrama para o Brasil não deixando clara a autoria da frase. Dita em francês, a frase acabou atribuída a De Gaulle e, para espanto do diplomata que a proferiu, ‘pegou’. Carlos Alves de Souza contou a história em detalhes em seu livro e, em 9 de maio de 1979, foi publicada entrevista sua no ‘Jornal do Brasil’, ocasião na qual reafirmou ser ele o autor da frase e não De Gaulle”.

- Operação Lagosta, A guerra que não aconteceu (Guilherme Poggio)

Surge o interesse pela lagosta
“Durante séculos, a captura da lagosta ao longo da costa do Nordeste brasileiro foi realizada de forma rudimentar, somente para subsistência das famílias da região ou abastecimento do pequeno mercado local. A partir da década de 1930 o crustáceo começou a ter maior valor comercial. 
Mas esta atividade econômica só despertou o interesse de companhias estrangeiras na década de 1950, quando empresas japonesas decidiram enviar barcos de pesca para o litoral do Nordeste. A licença foi emitida e, em contrapartida, o Governo Brasileiro exigiu a nacionalização de parte da tripulação dos barcos. Com dificuldade em cumprir tal exigência, os japoneses preferiram abandonar a pesca e comprar a lagosta diretamente dos jangadeiros brasileiros, obtendo uma boa lucratividade. Desta forma, estabeleceu-se uma atividade regular de captura naquela região, tornando-se realmente uma atividade econômica de valor. Em paralelo, a atividade contribuiu para o desenvolvimento da indústria de congelamento, além do aumento da atividade nos portos de Fortaleza e Recife por causa da exportação do crustáceo. Em 1955 exportaram-se 40 toneladas de lagosta. Cinco anos depois, este número subiu para 1.200 toneladas. 

O interesse francês na costa do Nordeste surgiu no início da década de 1960, ou seja, alguns anos depois dos acordos com o Japão. Uma delegação foi enviada ao Recife para negociar a vinda de três barcos de pesca franceses com o intuito de realizar pesquisas sobre viveiros de lagosta. A CODEPE, órgão federal responsável pelo desenvolvimento da pesca no país, emitiu uma autorização de pesquisa em março 1961, válida por 180 dias. Esta licença contemplava apenas três embarcações. 
No entanto, autoridades brasileiras já estavam preocupadas quanto ao real motivo da vinda dos pesqueiros. Foi decidido que representantes da Marinha do Brasil embarcariam nos navios franceses para atuar como fiscais de pesca. Após alguns embarques, os militares constataram que os navios estavam realmente capturando lagosta em larga escala e realizando pesca predatória com arrasto. Além disso, a licença de pesquisa emitida limitava-se a três barcos e a França enviou quatro. A partir do relatório dos militares embarcados decidiu-se pelo cancelamento da licença e o último pesqueiro partiu de volta para a França no final de abril de 1961. 
Em novembro os franceses solicitaram uma nova licença para a realização de pesquisas e experiências no litoral nordestino. Desta vez foi argumentado que elas seriam realizadas na plataforma continental, fora das águas territoriais brasileiras. E assim, uma nova leva de pesqueiros franceses chegou ao litoral nordestino no final de 1961.

Apresamentos realizados pela MB

Os desentendimentos começaram logo no início de 1962. No dia 2 de janeiro a corveta Ipiranga apresou o pesqueiro francês Cassiopée, cerca de dez milhas da costa, por estar capturando lagosta sem autorização do Governo Brasileiro. E pouco tempo depois a corveta Purus avistou dois pesqueiros (Françoise Christine e Lonk Ael) próximos à costa do Rio Grande do Norte, mas por determinação do Estado Maior da Armada (EMA) não foram apresados. 

O apresamento do Cassiopée gerou uma batalha diplomática entre os dois países que se estendeu por todo o ano de 1962. O Brasil sustentava a tese de que a lagosta era recurso econômico de sua plataforma continental (independentemente de estar no limite do mar territorial) e somente a ele caberia a emissão de autorização de captura do crustáceo. A França argumentava que a lagosta era um ‘peixe’, pois se deslocava de um lado para o outro dando saltos e não andando sobre a plataforma continental. Neste caso aplicar-se-iam (segundo os franceses) as regras da convenção de Genebra de 1958, que estabelecia as bases para pesca em alto mar (é importante destacar que nenhum dos dois países tinha assinado tal convenção). Segundo o comandante Paulo de Castro Moreira da Silva a fraca argumentação francesa levaria à seguinte frase: 
“por analogia, se lagosta é um peixe porque se desloca dando saltos, então o canguru é uma ave”.

A batalha diplomática não intimidou os pesqueiros franceses, e muito menos reduziu a ação dos navios da MB. O contratorpedeiro Babitonga apresou o pesqueiro francês Plomarch no dia 14 de junho e o Lonk Ael no dia 10 de julho ao longo do litoral do Rio Grande do Norte e a corveta Ipiranga os pesqueiros Folgor e Françoise Christine em agosto do mesmo ano no litoral cearense. Os capitães dos barcos eram orientados quanto à irregularidade cometida, ‘convidados’ a assinar um termo de compromisso e não mais voltar à costa brasileira (embora muitos assim o fizeram).
No início de 1963, uma missão francesa chegou ao Brasil com o intuito de negociar a questão da pesca da lagosta, bem como estabelecer as bases comerciais de um possível acordo binacional. Esta mesma missão informou que dois barcos de pesca já se dirigiam para o litoral brasileiro. Através do Ministério das Relações Exteriores, o Brasil respondeu que a permissão não seria dada aos barcos e solicitou que o governo francês não permitisse a vinda destes para não prejudicar as negociações em curso. A França não só confirmou a vinda dos dois barcos, como também anunciou a partida de outros, independentemente da ameaça de serem apresados. 

Sabendo da vinda de pesqueiros franceses para o litoral nordestino (sem a devida autorização), a MB colocou em alerta os seus navios que executavam patrulha na área. No dia 30 de janeiro, a corveta Forte de Coimbra detectou a presença de três pesqueiros estrangeiros e solicitou que os comandantes dos mesmos rumassem para Natal. Em função da resposta negativa, foi solicitada novas instruções de terra. O comandante do 3º Distrito Naval não vacilou e foi enérgico em suas palavras. A corveta deveria usar a ‘força na medida do necessário’. Possivelmente os franceses não entendiam português, mas o soar do alarme de ‘postos de combate’ e a visão da tripulação da corveta guarnecendo o canhão da proa e as demais metralhadoras de 20 mm mudou a idéia dos comandantes dos pesqueiros. 

No dia 5 de fevereiro os barcos e suas respectivas cargas foram liberados e, por intervenção do presidente Goulart, uma autorização para captura da lagosta foi emitida para os barcos franceses no dia 8. A mesma decisão que agradou os estrangeiros gerou um grande desconforto interno para o governo federal. Por força da opinião pública e de pressões políticas (principalmente vindas no Nordeste), o governo teve que voltar atrás e cancelar a autorização. A decisão foi tomada no dia 18 de fevereiro e os pesqueiros deveriam encerrar a captura da lagosta no dia 20. 
A mudança de atitude do Governo do Brasil despertou a ira do presidente de Gaulle.

 Alguns atribuem a este episódio a origem da frase: 
“Le Brésil n'est pas un pays serieux” 
(O Brasil não é um país sério)
Porém, numa outra versão dessa estória, o embaixador brasileiro em Paris (Alves de Sousa), em seu livro de memórias, afirmou que a frase foi dita por ele numa entrevista para um repórter brasileiro.

De qualquer forma, as relações com o Governo da França, que já não eram boas, degradaram-se rapidamente após a notícia da suspensão da autorização. A reação foi enérgica e desproporcional à situação. Por ordem do presidente de Gaulle, um navio de guerra francês seria enviado para proteger os barcos pesqueiros.
Extraordinariamente o embaixador brasileiro em Paris reuniu-se com o Secretário-Geral do Quai-D'Orsay. O embaixador francês foi alertado sobre as graves conseqüências que poderiam advir da presença de uma embarcação militar francesa no Nordeste e que o mesmo não deveria desprezar a hipótese de irrupção de um eventual conflito. A resposta francesa, direta e curta, limitou-se à seguinte frase: ‘já estamos em conflito’. A diplomacia estava em cheque e uma escalada militar começava a tomar forma. Estaria a MB devidamente equipada para enfrentar esta crise?”

Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva
Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA)
Acadêmico da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB) 
Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS) 
Rua Dona Eugênia, 1227
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