Testes
apontam que EcTI bloqueia crescimento de tumor e metástase.
Pesquisas são necessárias antes de uso em humanos, diz professora.
Árvore orelha-de-macaco, cujas sementes possuem proteína com
ação contra câncer. (Foto: Divulgação/Prefeitura Municipal de Campo
Grande/Wikicommons/Stickpen). Estudos feitos por pesquisadores da Universidade Federal de
São Paulo (Unifesp) apontam que uma proteína extraída da semente da árvore
conhecida como orelha-de-macaco tem ação promissora contra pelo menos cinco
tipos de câncer - gástrico, de próstata, melanoma (câncer de pele), colorretal
e leucemia.
Testes "in vitro" e utilizando ratos indicaram que
a proteína, batizada de EcTI devido à sua ação inibidora da enzima tripsina,
bloqueou parcial ou totalmente a proliferação das células de vários tipos de
câncer.
"Ela bloqueou os processos que fazem com que o tumor
cresça e que faça metástase, ou seja, que migre para fazer outras
invasões", afirma a professora de bioquímica da Unifesp Maria Luiza Vilela
Oliva, coordenadora das pesquisas.
As informações foram apresentadas na última semana, durante
a reunião anual da Federação de Sociedades de Biologia Experimental (Fesbe), em
Caxambu, Minas Gerais. A atuação da proteína contra células do câncer de mama
inicialmente é positiva e está sendo analisada, de acordo com a professora.
Melanoma
Ratos com um tipo de melanoma agressivo foram usados em experimentos com a
EcTI, que inibiu o crescimento do câncer. "Alguns animais sequer chegaram
a desenvolver o tumor. Em outros, [a proteína] inibiu 90%", afirma Maria
Luiza. Já estudos com células do câncer gástrico apontaram que a
EcTI impediu a adesão a tecidos saudáveis e inibiu a formação de
"protuberâncias" celulares relacionadas à metástase e migração
cancerígena, as chamadas "invadopodias".
Durante os testes, também foi constatado que a proteína tem
ação antitrombótica (agindo contra a formação de trombose) e anticoagulante. Um
dos últimos estudos sobre a EcTI foi publicado no site da revista científica
"PLoS One", em abril deste ano, e detalhou a estrutura da proteína.
Efeitos colaterais
Ainda precisam ser feitas pesquisas para entender a toxicidade e possíveis
efeitos colaterais da EcTI, diz Maria Luiza. Ela, no entanto, ressalta que de
início não foram identificadas reações adversas durante testes em ratos.
"Até o momento, não vimos toxicidade, aplicamos 4 miligramas em ratos e
não houve nenhuma morte", afirma. Possíveis efeitos alérgicos da proteína também precisam ser
analisados, mas até agora experiências mostraram que ela não deve causar
alergia, disse a professora da Unifesp. Um dos próximos passos é também ver
como a EcTI age em células do fígado humano.
O grupo de pesquisadores também está analisando
"fragmentos" derivados da proteína, os chamados peptídeos, para
entender como eles agem separadamente. "Não se pode aplicar a proteína na veia de um ser
humano", diz a cientista, ponderando que ainda são necessários muitos
testes antes de viabilizar o uso em terapias contra o câncer em pessoas.
Um peptídeo, diz ela, é mais simples de ser usado em um
tratamento, possivelmente por aplicação em via intravenosa. É provável que no
futuro a proteína seja feita de forma "recombinante", utilizando
bactérias manipuladas geneticamente para produzir a EcTI e assim eliminar a
necessidade de extraí-la da planta, afirma a cientista.
Árvore
A orelha-de-macaco, conhecida também como tamboril ou timbaúva, é uma árvore
encontrada principalmente nas regiões Centro-Oeste (no Mato Grosso do Sul) e
Sul (Rio Grande do Sul), mas também ocorre em estados como Maranhão, Piauí e
Pará, aponta um estudo do Instituto Florestal de São Paulo, ligado à Secretaria
Estadual do Meio Ambiente.
A árvore alcança altura média de 20 a 30 metros e tronco de
80 a 160 centímetros de diâmetro, segundo o estudo. Sua madeira é leve e era
utilizada por indígenas para fabricação de canoas - ela pode servir para
produção de caixotes, miolo de portas, armação de móveis e outras finalidades.
Com o nome científico de Enterolobium
contortisiliquum, a árvore "é indicada para o reflorestamento de áreas
degradadas de preservação permanente, em plantios mistos, por apresentar
crescimento rápido inicial", afirma o texto do Instituto Florestal. O fruto da planta tem formato parecido com uma orelha, daí o
nome popular. "Quando você abre o fruto, encontra as sementes. A gente
retira dali o cotilédone e isola várias proteínas.
Uma delas [a EcTI] tem ação inibidora de protease",
afirma a professora. A "protease", em questão, é a enzima tripsina. A
sigla EcTI significa, em inglês, "Enterolobium contortisiliquum Inibidora
de Tripsina".